14.11.08

O emo é brasileiro


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19 de agosto, 1994


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Chegou o dia de decidir de vez tudo sobre o novo caminho do rock mundial. Ontem um pouco antes de ir dormir me venho na mente uma harmonia pra nossa música. Corri, peguei o violão e dedilhei as notas. Tudo aconteceu naturalmente. Misturei rapidez e harmonia, uma variando com a outra durante a canção. Só resta mostrar pra gurizada pra dar o veredicto.


O Franjinha como de costume apareceu antes da hora marcada, cheio de disposição e já foi me contando sobre o vestuário do “novo movimento”.


-Cara essa minha franja tem que ser adotada, mas atrás a gente faz o arrepiado punk pra dar aquela atitude. Também seria legal se botássemos uma maquiagem no olho pra dar um ar depressivo, quase gótico, só um pouco mais leve. Camiseta de listras horizontais preto e branco e calça jeans. Tênis pode ser esse all-star velho mesmo, a gente borda uns pedaços quadrados em branco fazendo algo tipo um tabuleiro de xadrez e tal...


“Esse é o cara!”, eu gritava nos meus pensamentos. Concordei com cada item citado. Essa ia ser a roupa do primeiro show.


Enquanto acabávamos de falar das roupas adentra o quarto, com uma tremenda cara de sono, o Breno. Senti que não tinha feito nada do que fora acertado ontem, e realmente não tinha feito.


-Acabei pegando no sono... – disse o Breno


Assim mostramos o vestuário montado pelo Franjinha pra ele. E o comentário foi:


-Não acha muito coisa de emotivo isso ae?!


“Emotivo”, essa palavra encaixava e preenchia perfeitamente o desenho do nosso projeto. Pensei em mudar o nome da banda para “Emotivos” , eles imploraram para que não. Foi ai que Breno parece ter acordado e teve a idéia de que precisávamos. O movimento chamaria-se “emotivo”. Nós fazemos rock emotivo, a novidade é essa, Rock Emotivo.


Só faltava eu apresentar a música finalizada para eles. O violão foi soltando o som de cada nota pelos ouvidos atentos dos dois. Cantarolei a letra. Ao final eles bateram palmas, acharam brilhante e inovador. Mesmo com minhas falhas na voz e no tocar a viola velha do meu pai.
Tudo ocorreu da melhor maneira possível. My Tears ensaiará ainda nesta semana e se apresentará na outra, precisamente no dia 28.


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20 de agosto, 1994


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Sábado com cara de domingo de tarde, nublado e depressivo. Entretanto contrastando perfeitamente com o astral ao qual estávamos. O ensaio foi marcado para as 18:00 em um estúdio de um conhecido do Breno.


Resolvi cortar eu mesmo o meu cabelo naquele começo de tarde. A tesoura já meio gasta mais arrancava do que cortava. Picotei de forma que deixasse tudo arrepiado na parte de trás. Sai do banheiro e minha mãe quase teve um troço:


-Mas o que é isso guri?! Vou te dar dinheiro e você vai já no cabeleireiro pra ver se arruma isso ai!


Tentei argumentar. Não fui bem sucedido. Ficamos meio brigados, pois continuaria com aquele corte e ela não aceitava. Eu também não poderia esperar algo muito diferente disso.


A ansiedade aumentava para o primeiro ensaio em estúdio. Havia comprado baquetas novas no shopping, um par será usado em ensaios e o outro em shows. Tudo bem pensado.


Quando o relógio apontou 17:55 eu estava justamente na porta do estúdio. Franjinha estava encostado na parede e contou ter chegado as 17:30. Entramos e fomos arrumando nossos equipamentos. Enquanto eu colocava os pratos na bateria o Franjinha ligava o baixo e ajeitava o microfone. Breno surgiu após 10 minutos do horário marcado (atitude normal dele), e então começou a preparar sua guitarra.


Quando todos estávamos prontos é que Franjinha e Breno notaram o meu cabelo. Logicamente a zoação pegou forte. “Sonic recém acordado!”, “pegou um vento de costas!”, “estica na frente e pica atrás!”, e outras piadinhas desse nível. Porém eles haviam curtido, e o Breno disse que iria fazer um moicano antes do nosso show.


O papo estava legal, mas estávamos pagando a hora para tocar, e logo começamos. Primeiro treinamos umas covers: Carousel – Blink 182 (tinha ganho uma fita (Buddha) do meu pai depois da viagem dele aos EUA), Smells Like Teen Spirit – Nirvana e Poison Heart – Ramones. Depois nos concentramos na nossa música própria “Não te esqueço”. O ensaio acabou e ela ainda não estava 10% finalizada, a bateria e o baixo tinham que ser acertados alguns detalhes. Mais um ensaio e ficará pronta para o show na escola.

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